sexta-feira, setembro 30, 2011

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domingo, setembro 25, 2011

A PSICOPEDAGOGIA E A PSICANÁLISE

Ana Lisete Frontini Pereira Rodrigues

Para trabalhar a aprendizagem, é necessário conhecer a teoria psicanalítica, uma vez que ela auxilia o entendimento do ser e de seus relacionamentos, e portanto de seu mundo, o que se mostra fundamental para o trabalho do profissional.

Por que a escolha da psicanálise para embasar seu trabalho psicopedagógico?
Após ter militado nas diferentes áreas do conhecimento por meio de grupos de estudo e supervisões e não ter encontrado respostas para todas as minhas indagações, busquei a Psicanálise para embasar meu trabalho, por ser um referencial teórico fundamental sobre a mente humana. A Psicanálise foi buscada por mim por meio do estudo de Freud e isso me levou a conhecer os trabalhos desenvolvidos por Melaine Klein e Bion.
Acredito que o estudo da Psicanálise é uma forma de lidar com a personalidade inigualável, pois possibilita conhecer o ser humano, o modo como este se conhece, seu objeto de desejo, seus impulsos e seus valores. Enfim, permite conhecer a estrutura do mundo mental e sua organização. Acredito que para trabalhar a aprendizagem, é necessário conhecer a teoria psicanalítica, uma vez que ela auxilia o entendimento do ser e de seus relacionamentos, e portanto de seu mundo, o que se mostra fundamental para o trabalho do profissional. 

Quais são os pontos de contribuições da psicanálise para a psicopedagogia?
As principais contribuições da Psicanálise a Psicopedagogia abrangem fundamentalmente o funcionamento e a dinâmica da estrutura da personalidade, o modo como cada indivíduo lida com seus impulsos e desejos (função do id), a maneira que cada aprendiz lida com a percepção de si (função egóica), o modo como a criança, o adolescente ou o adulto lidam com seus objetos internos, o modo como cada pessoa valoriza ou não seus objetos internos (função superegóica) e a maneira como valoriza e aproveita seus valores adquiridos de seus pais, professores, amigos, etc.
A Psicanálise auxilia o psicopedagogo a dar um significado maior ao vínculo e à relação com o indivíduo que ele atua. Existem pessoas que necessitam serem trabalhadas com uma metodologia psicanalítica mais clássica para lidar com suas dificuldades, e portanto podem ser beneficiadas pelo uso da associação livre. Há outras metodologias de trabalho aplicadas em crianças e adolescentes que resolvem suas dificuldades por meio de jogos e atividades artísticas que também contribuem para o progresso do indivíduo.
O psicopedagogo precisa estar atento para perceber que tipo de metodologia deverá utilizar em cada cliente/paciente. Para isso é importante analisar o vínculo que estabelecemos com cada paciente, suas necessidades e a maneira de trabalhar que combina melhor com suas características individuais e/ou sociais.
No caso da Psicopedagogia, o que determina qual a linha de trabalho, além das mencionadas acima, são os valores familiares, os valores da escola que o indivíduo estuda, e sua cultura. 

O psicopedagogo não corre o risco de estar fazendo uma terapia emocional e deixar de lado a sua função que é lidar com a aprendizagem?
Se o psicopedagogo for um investigador das necessidades da criança ou do adolescente que for procurá-lo ao consultório, ele saberá distinguir essas diferentes funções sem prejuízo dos seus objetivos. Ao lidar com a aprendizagem, o efeito terapêutico acaba ocorrendo naturalmente quando há cuidados com a linha teórica escolhida. No entanto, ele é secundário. É importante entender como o indivíduo se conhece como pessoa, como ele se vê e qual seu envolvimento com o mundo ao seu redor, mas isso não representa deixar de lado a função de lidar com a aprendizagem. Apenas ajuda a alcançar êxito nessa tarefa de um modo mais simples, mais claro e portanto mais eficiente. Acredito que isso possa ocorrer quando se tem em mente que as pessoas são um todo, isto é, possuem seu mundo mental e suas organizações social e cultural.
Precisamos sempre ter claro que o uso de diferentes metodologias deve ser feito não por submissão ao método, mas porque acreditamos nele. É por isso que o psicopedagogo tem que saber com quem está lidando, quem é seu paciente, como ele vê os seus desejos, os valores adquiridos, e conseqüentemente a aprendizagem, para poder assim, escolher o método que considera mais adequado para cada paciente.


Profissionais da psicopedagogia que vem de outras áreas como: pedagogos, fonoaudiólogos não tiveram a psicanálise como fonte teórica. Qual a necessidade do psicopedagogo optar por uma teoria?
A diferente origem dos atuais profissionais da Psicopedagogia é algo que me preocupa muito. O psicopedagogo advindo da área de saúde ou da educação, que são áreas afins, deverá buscar uma linha teórica que se identifique mais com ele como indivíduo. Além disso, ao se aprofundar em alguma linha específica, o profissional poderá utilizá-la cada vez melhor. É isso que diferencia um bom profissional de outro e cria sua identidade de psicopedagogo diferenciada e única. Acredito que o processo deverá ser criativo, mas um referencial teórico é fundamental para o embasamento do profissional, que não deve cair no erro de ser eclético, isto é, saber um pouco de tudo e não se aprofundar em nada.
O conhecimento cuidadoso e constante transformará o psicopedagogo num profissional cada vez mais qualificado. 

Qual foi o caminho que você percorreu na sua formação pessoal em psicopedagogia?
Durante meu curso de psicopedagogia, percebi que o mundo mental não era tão simples quanto eu estava olhando. Vi assim a necessidade de aprofundar-me, e desta forma fiz supervisões durante todo o período que fiz o curso, tanto as dadas durante o curso, como também nas áreas psicomotora, cognitiva e familiar, com outros profissionais advindos de minha formação.
Comecei estudando os autores ligados a psicomotricidade e depois fiz grupos de estudo de Lowen, Melaine Klein, Jung. Fiz também um estudo de linguagem não verbal por vários anos e atualmente continuo a estudar, porque acho que um bom referencial teórico é importante, e a fazer supervisões que permitem analisar a prática desses referenciais. Estou terminando um grupo de estudo sobre Freud e sua obra completa. Por isso acredito que quando busquei a Psicanálise para entender a estrutura da personalidade, eu já tinha um bom referencial teórico.



Qual a importância para o profissional da psicopedagogia o trabalho pessoal? Por quanto tempo se deve fazê-lo?
O trabalho pessoal a meu ver é necessário e eu questiono se não seria também fundamental. Acredito que o tempo de terapia ou de psicanálise dependerá de vários fatores, e que é onipotente um profissional querer determinar sua exata duração. Na verdade o tempo irá depender das características de cada pessoa. Assim percebe-se porque é difícil determinar o tempo exato para o trabalho com qualquer um de nossos pacientes.
O essencial é que nós profissionais nos conheçamos bem para saber como lidar com nossa clientela. Quem não passa por um processo terapêutico dificilmente conseguirá entender o ser humano na sua essência. Eu percebo também que a supervisão é indispensável ao longo do trabalho. Você precisa reconhecer no seu dia-a-dia, por exemplo, o que é uma identificação projetiva e não apenas conhecê-la na teoria. Isso é um trabalho que requer grandes investimentos, mas é sem dúvida nenhuma o que diferencia um profissional qualificado dos demais sendo por isso extremamente necessário.
Outra questão que sempre vejo quando se discute esse tema é a reflexão sobre a possibilidade de fazer psicanálise em grupo. Ao meu ver, se estivermos na busca individual do conhecimento mental e de suas organizações, não é possível que o alcancemos com um trabalho em grupo. Mas isso é tema para uma discussão posterior em outra entrevista. 


Quais são os problemas de aprendizagem mais comuns observados por você?
Cada ano que passa, percebo que tanto a criança como o adolescente e o adulto apresentam uma configuração muito mais complexa de suas dificuldades de aprendizagem. Acredito que isto esteja ligado aos atuais problemas sociais, ao emocional, ao cognitivo, e não exclusivamente ao psicopedagógico. Essa dificuldade também abrange o uso da auto imagem. É devido a isso que, para mim, os problemas de aprendizagem, e portanto as dificuldades cognitivas geralmente não vêm desvinculadas da problemática emocional.
Percebo também que as dificuldades de se vincular com os conhecimentos de modo geral podem ser também uma conseqüência da dificuldade de lidar com as pessoas. A curiosidade pelo desconhecido é inata no ser humano, todo mundo se mostra curioso com o novo, e a criança que não tem curiosidade, que se mostra "preguiçosa", certamente tem alguma coisa que não está adequada.



Qual a responsabilidade da escola no quadro atual?
A escola deverá se preocupar com a formação do aluno e com a cultura que ele está inserido. Para tal, deverá também estar sempre atenta ao ritmo de aprendizagem de cada um de seus alunos. Percebo que algumas escolas estão muito preocupadas com o conteúdo. Acredito que isso seja uma conseqüência da sociedade que vivemos, cada vez mais competitiva. As escolas não deveriam se esquecer do ritmo de aprendizagem da criança, da boa estrutura do pensamento, da lógica no raciocínio e da utilização de uma linguagem cada vez mais adequada para ser usada ao longo da vida. Com esses pré-requisitos qualquer pessoa poderá se aprofundar no conhecimento que quiser, respeitando-se suas individualidades e seus diferentes talentos. A melhor instrumentalização para tudo isso, é o papel que a escola deverá desempenhar.
Generalizando, podemos dizer que normalmente não são as escolas que são fortes ou fracas, adequadas ou inadequadas, como muitos gostam de rotular, mas na verdade cada criança, cada família, necessita de um tipo de escola. Cada pessoa tem um perfil, assim como a escola.


Qual o papel do psicopedagogo na orientação de escolas para o paciente?
O papel do psicopedagogo é evitar o troca-troca de escola que é a princípio contraproducente. É preciso buscar a escola correta para determinado paciente e para isso a orientação familiar é básica, principalmente na questão dos valores que esta família tem, no que ela acredita.
É necessário que se faça uma análise deste paciente para saber se a escola está adequada à família e vice-versa. Vejo casos de famílias que acabam colocando o filho em escolas com valores opostos aos seus, o que é prejudicial. Aproximadamente aos 11 anos de idade, a criança passa por uma época em que se refaz o complexo de Édipo e, portanto, se reorganiza sua personalidade. É também nesta época, que as escolas deixam de respeitar o ritmo individual de seus alunos, acreditando que eles estão mais aptos a terem um ritmo social de aprendizagem. Essa etapa deverá ser vista com bastante cuidado tanto pela família quanto pela escola.
Quando esta etapa não ocorre com tranqüilidade, e as escolas percebem que as crianças não estão aptas ao ritmo social de aprendizagem, aparece o momento em que o psicopedagogo deverá interferir.

Ana Lisete Frontini Pereira Rodrigues - Pedagoga e Psicopedagoga formada pelo Instituto Sedes Sapientiae. Formação Psicanalítica. Desenvolve trabalho clínico. Vice-Presidente da ABPp 1992/1994. Diretora Cultural e Conselheira da ABPp 1999/2000 Ana Lisete Frontini Pereira Rodrigues